domingo, junho 11, 2006

Aquele Olhar



Andando, pego um pedaço de uma foto no chão. Rasgada, continha algumas palavras e só uma parte visível de um rosto, devido à água que já tinha deteriorado o retrato.
Por sorte, os olhos ainda apareciam e eram acompanhados por “Funcionário do Mês”. No verso, a logo-marca da mesma empresa que servia o almoço pro meu escritório.
Ah! Aquele olhar... Seus olhos delineados por um lápis sutilmente marrom demonstravam certa tristeza. Não era algo explícito, mas as pequenas mínimas tensões sobre aqueles olhos levemente puxados e castanhos transmitiam muita coisa! Aflição e esperança contrastavam naquelas retinas fundas que pareciam me hipnotizar.
Incessantemente me pus a procurar a dona daquele olhar! Comprava nos três caixas diferentes de cada lanchonete, percorria o ‘drive-tru’, olhava lenta e fixamente o rosto de cada funcionária... E NADA!
Eu já não dormia direito pensando em como a procuraria no outro dia. Já tinha dispensado o almoço que me entregavam, porque preferia ir a cada unidade para achar a funcionária daquele mês.
Só que essa caça foi me cansando... Assim como meu trabalho fazia. Deixara de percorrer a cidade atrás daquela mulher e esperava, agora por sorte, encontra-la. Mas a sua foto continuava em minha mesa.

Certo dia, deixei de enfiar minha cabeça nos papeis por um instante e descansei por um breve momento até meu almoço chegar.
O telefone toca e mando o entregador entrar. Pra minha surpresa era uma mulher. O que pude perceber ao ver suas feições pela primeira vez. Ela vinha de cabeça baixa, eu a olhava com uma pontinha de curiosidade até. Mas em um súbito instante ela se assusta! Apavorada, deixa a bandeja cair e olha-me completamente assustada! Eu, com toda aquela situação não entendia nada e parecia mais pávido ainda.
Era ela! A moça dos olhos que tanto procurava! Ela era a entregadora, estava tão próxima de mim e não tinha percebido!

Após o susto, me perguntou o que a foto dela fazia lá. E expliquei tudo a ela. A seguir ela me disse que tinha rasgado a foto porque depois de muito tempo tentando, ela não conseguiu chamar a minha atenção e desistiu. Chorou, chorou e em um momento de raiva rasgou a foto, pois de nada servia tudo aquilo se ela não tinha quem gostava.

Hoje estamos casados. Ainda ando com a foto na minha carteira. E quem poderia dizer que por trás de um olhar haveria tantas coisas...


Cauã

Um comentário:

Maurício disse...

Às vezes as coisas estão tão próxima de nós que nem nos damos conta. Ficamos tão aguniados em achar a tal pessoa certa que vendamos os olhos e nem percebemos que ela já chegou há muito tempo.
Muito bem escrito e bem inventado! Nota mil pra sua criatividade!
Lindos olhos!

Acaná.