quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Sonhar acordado, dormir sonhando

Tinha sido um sonho difícil, daqueles que dão muita sede quando se acorda com o lençol no chão e o corpo todo melado de suor. As janelas daquele apartamento mínimo que não tinha parede entre a sala, o quarto e a cozinha estavam fechadas. E ele não precisava. De tão pequeno, conhecia cada centímetro de bagunça que lá existia, sem ter que abrir os olhos e com as mãos amarradas. O problema era que aquela tontura forte de quem se levanta rápido não passava.
Abriu a torneira da pia e pegou aquele copo, que sempre ficava em cima do fogão, e encheu-lhe de água. Tomou três copos cheios e a sede não passou. O sono também não voltou.
A habilidade dele com o apartamento escuro era inversamente proporcional à sua noção de horário, ele não fazia idéia de que horas eram, só sabia que já era noite.

Só que dessa vez seu relógio biológico nunca esteve tão errado. Ele abriu a cortina e uma luz que ele nunca tinha visto tão forte ofuscou seus olhos. E aquela cegueira se juntou a tontura e a sede. Ficou deitado na cama por incontáveis minutos e o brilho daquele sol novo não saia do quarto. Alguma coisa estava estranha.
Ele fitou aquele feixe de luz por outros incontáveis minutos e resolveu encara-lo. Pegou seu lençol no chão, cobriu a cabeça e saiu andando. Bateu a porta do apartamento e desceu as escadas. Nunca tinha visto pessoa parecido com aquele que estava na portaria, o homem ficou o olhando com a mesma cara de espanto.
No primeiro passo na calçada ele caiu, alguém o ajudou, só que ele não conseguia ver o rosto dessa pessoa, algum tipo de sombra encobria-o. Parece que tinha desmaiado e acordado já em pé e longe de seu prédio. Mas o medo era ínfimo comparado àquela curiosidade ensolarada, continuou andando. Todos aqueles prédios não eram estranhos, era a sua vizinhança, só que com uma psicodelia de cores e brilhos nunca antes imaginada.
Reflexos nas sacadas, vidros verdes, carros amarelos, barulho, muito barulho, pessoas falando forte, pessoas que se olhavam, pessoas que não se olhavam, uma orquestra de bocas cantando várias notas inaldíveis ao mesmo tempo. Nunca tinha visto tantas pessoas juntas naquela rua.
E o mais estranho era achar tudo aquilo tão diferente e semelhante ao mesmo tempo, como um déjà-vu.

Ele passou um dia inteiro nesse déjà-vu, andou, andou, andou... Até que escureceu. E as coisas começaram a ficar do jeito que ele era acostumado a ver. E foi começando a fazer sentido, aquilo era o dia, o dia que ele nunca tinha vivido. E de tão impressionado com o dia, começou a estranhar a noite. Sentiu falta de todo aquele barulho, das cores, dos carros, das pessoas.
Correu para seu apartamento, passou pelo mesmo porteiro de sempre, - o qual não estranhou aquela correria - deitou na cama e ficou pensando em tudo que tinha passado naquele dia. Pensou se as pessoas já tinham o visto, pensou em porque o porteiro do dia cheio de luz o olhou estranho e porque o porteiro da escuridão não tinha se importado com o seu desespero.

E de tanto pensar, dormiu. E acabou sonhando que acordava no mesmo apartamento. Só que agora as janelas estavam abertas, com muita luz e nada tão estranho, e pensou: Ele estava acordado e tinha sonhado que conhecia a noite ou ele estava dormindo e tudo que ele está passando durante o dia é um sonho?

Cauã

2 comentários:

S disse...

Ok, mauricio isso foi estranho tive que reler o final pra poder entender. Para de usar essas substancias quimicas, tao te fazendo mal. hahahahahhaahhah

mim disse...

literalmente deste um nó nas minhas idéias, tchau, vou tentar desatar.